Proposta abrange casos de preconceito por orientação sexual, identidade de gênero, religião, entre outros.
A ausência de uma tipificação específica para crimes de ódio e intolerância pode estar com os dias contados no Brasil. Tramita atualmente na Câmara dos Deputados, em Brasília, uma proposta que pretende incluir esse tipo de agressão no Código Penal, abrangendo casos de preconceito motivados por orientação sexual, identidade de gênero, religião, situação de rua, condição de migrante e deficiência, entre outros.
O Projeto de Lei (PL) 7582/2014, que se encontra na Comissão de Direitos Humanos e Minorias sob a relatoria da deputada Luiza Erundina (Psol-SP), define como prática de ódio a ofensa à vida, à integridade corporal ou à saúde motivada por preconceito.
Já o crime de intolerância é definido a partir de situações de violência psicológica; recusa ou impedimento de acesso a qualquer meio de transporte público; impedimento de inscrição, ingresso ou permanência de aluno em estabelecimento de ensino público ou privado; entre outros casos.
Autora do PL, a deputada Maria do Rosário (PT-RS) destaca que o objetivo do projeto é engrossar o coro da luta contra a intolerância, uma das bandeiras mais presentes no debate sobre direitos humanos.
“Ele não tem apenas uma perspectiva punitiva. O que nós queremos é que aconteça uma nova consciência no país de que nenhum crime de ódio deve ser aceito. Não é razoável que as pessoas sejam atacadas por razões da sua identidade, por serem quem são”, argumenta.
Violência versus cidadania
Estudioso das políticas públicas para a comunidade LGBT, o pesquisador Cleyton Feitosa, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (Ipol/UnB), aponta que a tipificação dos crimes de ódio e intolerância se comunica diretamente com a necessidade de promoção da cidadania da população LGBT.
“[A lei] é uma demanda que parte da sociedade civil, numa compreensão de que o Estado tem o dever de garantir a proteção social, de assegurar direitos fundamentais”, resume.
O pesquisador destaca ainda que o avanço da violência contra o segmento exige ações estatais capazes de alimentar uma mudança cultural no país. Em 2017, o Disque 100, canal nacional que recebe denúncias de violação de direitos, registrou 2.998 denúncias de violações contra LGBTs, sendo 70% delas de discriminação.
E a violência assume sua face mais cruel quando o assunto são os assassinatos. Segundo dados do Grupo Gay da Bahia (GGB), o ano de 2017 apresentou aumento de 30% nos homicídios LGBTs em relação a 2016. Foram, ao todo, 445 mortes.
Para Feitosa, que defende a aprovação do PL 7582/2014, as ações estatais de combate à discriminação passam também pelo Legislativo.
“Há uma naturalização muito forte da LGBTfobia no Brasil, e aí uma lei como essa seria importante para a população LGBT se sentir um pouco mais protegida. Seria um passo muito importante nessa proteção estatal”, diz.
Intolerância religiosa
Alvo constante de preconceito, os praticantes das religiões de matriz africana também engrossam o coro pela tipificação dos crimes de intolerância. Apenas em 2017, o Disque 100 recebeu 537 denúncias de intolerância religiosa.
No cotidiano desses grupos, as manifestações de ódio são as mais variadas e vão desde violência física até ataques a terreiros.
O coordenador do Fórum Permanente das Religiões de Matrizes Africanas de Brasília e Entorno (Foafro-DF), Ògan Luís Alves, destaca a preocupação com a postura de líderes religiosos que incitam o preconceito contra praticantes de outras crenças.
Diante disso, ele defende um aprimoramento do PL 7582 no sentido de prever também a criminalização da conduta.
“Enquanto nós não responsabilizarmos esses líderes, nós não teremos uma redução da intolerância, do racismo religioso provocado por aqueles que julgam ser a sua religião a única [possível]”, lamenta.
O PL considera o crime de ódio como um agravante do crime principal ao qual esteja associado, propondo um aumento da pena deste de um sexto até a metade do total. Já para a prática de intolerância são previstos prisão de um a seis anos e pagamento de multa.
// Fonte: Brasil de Fato