O filme pantera negra- entre a ficção e a valorização da cultura africana

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Quando nos deparamos com abordagens sobre a história da África devemos nos atentar com a forma de como ela é contada. Quem a conta? E com qual intuito? Tanto nas histórias como nas imagens fixas encontradas em livros devemos desconstruir estas imagens e estas histórias numa perspectiva africana. A África é o berço das primeiras civilizações, o que pressupõe muitas histórias a serem contadas.

Segundo dados trazidos por Carlos Moore (2005) a extensão territorial do continente equivale a 20% da superfície sólida da Terra, com uma topografia variada, habitada por grandes savanas, vastas regiões desérticas, altiplanos, planícies, regiões montanhosas e imensas florestas. Além de abrigar a convivência de mais de 2000 povos, é a mais longa ocupação humana de que se tem conhecimento (2 a 3 milhões de anos, aproximadamente) e, consequentemente, há a complexidade dos fluxos e refluxos migratórios populacionais.

Apesar de todos estes dados, o que ficamos sabendo nos livros didáticos e em meios midiáticos é basicamente que, na África há miséria, guerras ou conflitos tribais, quando são no mais que disputas pelo poder político e econômico. Logo, conflitos, disputas e situações vulneráveis existem em vários países do mundo. Daí parte a grande frustração quando nos deparamos com livros didáticos e notícias relacionadas ao continente: a imagem dos africanos subjugadas e pejorativas limitadas a estes assuntos.

Deste modo, é um grande desafio para a historiografia destacar a importância da África para o mundo contemporâneo, descolonizando-a. O historiador e o professor são os grandes agentes capazes de moldar a História que nos é contada, será mesmo que a África apresenta apenas aspectos negativos?

A resistência dos povos, o desenvolvimento do continente pré e pós colonização são outras visões que permitem enriquecer o conhecimento acerca da África.

Referente as implicações contidas na história que é contada pelos agentes do poder, a escritora nigeriana Chimmamanda Ngozi destaca os perigos de uma história única, para ela, conhecer o desconhecido pelo seu próprio olhar é diferente do que acompanhar o noticiário midiático, que carrega preconceitos, afinal, “não há uma única história, conhecer mais histórias é chegar ao paraíso”, conclui. Mas, o que um filme de ficção da Marvel tem a ver com tudo isso?

O filme, apesar de ser uma obra de ficção, retrata um mundo dentro da própria África, valorizando elementos culturais do continente. Quando se assiste ao filme é perceptível que se está retratando a África, evidenciando os aspectos ritualísticos, culturais, de vestuário, de organizações tribais, linguísticos e de riquezas naturais do continente. O vibranium elemento cósmico fictício proveniente de um meteoro que caiu na região de Wakanda (país cinematográfico) tem um poder grandioso com capacidade de absorver todas as vibrações em contato, assim como toda a energia dirigida a ele, e está presente em toda a estrutura de Wakanda, transformando-a numa cidade altamente tecnológica. Esta valorização que o filme dá a cultura africana, ao poder de um super-heroi negro e de um “país” africano é muito importante para instigar o conhecimento sobre a África e sua historiografia. É necessário descolonizar olhares sobre este continente e seus povos descendentes.

O antropólogo e professor Kabengele Munanga (2015) afirma ser fundamental voltar o ensino de história da África para a formação de uma nova cidadania,

“(…)importância e urgência em todos os países do mundo em implementar políticas que visem ao respeito e ao reconhecimento da diferença, centradas na formação de uma nova cidadania por meio de uma pedagogia multicultural” (MUNANGA, Kabengele. Por que ensinar a história da África e do negro no Brasil de hoje?, 2015, p.21)

O filme, portanto, deixa um legado, implicando no imaginário relativo ao continente africano tanto em termos do passado como do presente, rompe com as visões pejorativas aos povos africanos e instiga o interesse pela historiografia da África, contribuindo também para o ensino.

Por Ayana Kissi Meira de Medeiros para o Portal Geledés