Desoneração da folha de pagamento e seu reflexo na Previdência Social

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Muito tem se debatido sobre o Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o seu rombo considerado o maior da história e que chega a um valor próximo a R$ 48 bilhões.

O que certamente tem assustado os mais leigos e os trabalhadores que convivem com a incerteza. Mas afinal, qual é a realidade do sistema?  As informações oficiais sobre o RGPS relativas ao período janeiro/julho de 2013 não apresentam grandes mudanças em relação à tendência do modelo no médio e no longo prazos.

O RGPS, na verdade, é composto por dois subsistemas que devem ser compreendidos e analisados de forma diferenciada, principalmente se o interesse for o de verificar a verdadeira situação do equilíbrio previdenciário. Trata-se de verificar a dinâmica particular de: o conjunto dos trabalhadores urbanos; e o conjunto dos trabalhadores rurais. Essa questão metodológica se justifica pela própria história recente do modelo previdenciário em nosso País.

Os agricultores e assalariados do campo não tinham acesso aos benefícios da seguridade social até 1988, quando a Assembleia Nacional Constituinte resolveu corrigir essa reconhecida injustiça social. A partir de então, essa parcela expressiva de nossa população passou a ser incluída ao RGPS, mesmo sem nunca ter contribuído.

Para Antonio Cortez Morais, conselheiro representante da Força Sindical no Conselho Nacional de Previdência Social – CNPS, vice-presidente do Sindiquímicos e secretário de assuntos previdenciários da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Ramo Químico – CNTQ e Força Sindical Estadual, a incorporação dos rurais ao sistema corrigiu um equívoco. “À época, esta incorporação poderia representar um problema, o que certamente não ocorreu. Hoje a desoneração da folha de pagamento atingiu um patamar  e os números divulgados desde a sua adoção em 2012 demonstram um agravamento financeiro  muito maior do que o benefício concedido aos trabalhadores”, diz.
Os dados dos subsistemas: Urbanos e rurais

 

Conforme dados divulgados em reportagem do Correio do Brasil, o subsistema dos urbanos apresenta uma receita total de R$ 161 bilhões, frente a uma despesa total de R$ 150 bi. Isso significa um superávit nas contas equivalente a R$ 11 bi. Além disso, se forem computadas as demais renúncias previdenciárias, o superávit sobe para R$ 25 bi. Longe, portanto, muito longe das previsões alarmistas sobre eventual “rombo estrutural” no regime.

No entanto, o subsistema dos rurais oferece um quadro bem distinto, em razão do já mencionado histórico de não contribuições. A consequência mais imediata é que seu lado de receitas é mais frágil. Para o mesmo período do que acima retratado, o quadro é de uma arrecadação total de apenas R$ 3,5 bi, diante de uma despesa de R$ 44 bi. Esse descompasso de quase R$ 41 bi é que se soma ao superávit dos urbanos e resulta no tão alardeado “rombo previdenciário” de R$ 30 bi entre janeiro e julho.

A tentativa de responsabilizar essa diferença por conta de um inexistente desequilíbrio previdenciário é de grande irresponsabilidade.  Tanto que mais de 99% dos benefícios pagos mensalmente aos aposentados e pensionistas rurais é de valor menor ou igual a um salário mínimo. Não faz sentido que um modelo como esse seja o bode expiatório dos que propõem insistentemente reformas previdenciárias, com o único intuito de promover a privatização desse enorme volume de recursos que representa o RGPS.

Regime previdenciário está equilibrado

Afinal, é fácil imaginar a voracidade com que o sistema financeiro encara um sistema que arrecada e gasta quase R$ 350 bilhões por ano.

Em uma aventura perigosa, e porque não dizer audaciosa, o governo optou pela  desoneração da contribuição previdenciária sobre a folha de pagamentos. Ao ceder a mais essa antiga reivindicação do capital, a equipe econômica termina por expor de forma irresponsável o conjunto do RGPS ao risco de desequilíbrio no futuro. A alíquota de 20% sobre salários que as empresas devem recolher à Previdência Social foi substituída por uma receita derivada de outra alíquota (entre 1% e 2%, variável de acordo com os setores) incidente sobre o faturamento. Ocorre que o volume de recursos arrecadados por essa nova fórmula de cálculo tributário é mais reduzido que a antiga contribuição sobre a folha. Regulamento posterior prevê que o Tesouro Nacional promova uma compensação ao RGPS por conta dessa perda de receita. Mas o ajuste é incerto e só se efetua a cada 4 meses. Com isso, a previdência social é claramente prejudicada.

Os riscos da desoneração da folha de salários

Há uma série de estudos demonstrando que as iniciativas adotadas pelo governo de desonerar o capital não tem provocado os efeitos econômicos desejados. Além da desoneração da folha de pagamentos, houve medidas na área de IR, IOF, IPI, PIS/COFINS e outros tributos. Os preços dos produtos e dos serviços não foram reduzidos no montante que se esperava e o fenômeno mais relevante foi a elevação da margem de ganho das empresas.

Como a maior parte dos tributos incide diretamente sobre a compra de bens e serviços, os mais pobres recolhem ao fisco o mesmo valor que os ricos quando compram um litro de leite ou um pãozinho na padaria, quando pagam a fatura de eletricidade ou quando utilizam o transporte coletivo. Por outro lado, as alíquotas de imposto de renda beneficiam os que ganham muito acima dos limites e que contam todo tipo de abatimento no momento da declaração anual. Finalmente, a resistência em regulamentar o Imposto sobre Grandes Fortunas soma-se às sucessivas facilidades para renegociar as dívidas das grandes empresas junto ao fisco.

Em suma, a política generalizada e não planejada de desoneração tributária beneficia muito mais aqueles que dela não precisam. E, no caso da previdência social, corre o sério risco de promover um desequilíbrio em um regime que consegue se manter como pilar importante da redução das desigualdades e da distribuição menos injusta da renda. “Ao lançar mão da arrecadação tributária e promover a desoneração da folha, o governo alegou que os setores beneficiados estavam em dificuldades para competirem com as empresas de outros países pondo em risco a geração de emprego. Entretanto, mesmo com as garantias do governo, as empresas não oferecem contrapartida ao trabalhador, como manutenção de postos de trabalho aos trabalhadores, muito menos aos trabalhadores com idade superior aos  50 anos. Neste sentido, a desoneração só tem beneficiado o empregador”.

Diante de todos os dados apresentados, os representantes dos trabalhadores entendem que se faz necessário a urgente mudança às regras do processo negocial.  “Defender o futuro de empresas brasileiras ou mesmo as multinacionais, instaladas em nosso país, sacrificando a nossa Previdência Social e, consequentemente,  todos aqueles trabalhadores a ela vinculados, é inaceitável. O caráter social da nossa Previdência é para com os trabalhadores, afirma a Constituição de 1988”, encerra Cortez.

Fonte: Força Sindical