Muito além da Renca: O plano do governo federal para aumentar a produção mineral no País

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Os planos do governo para revitalizar a indústria minerária brasileira vai muito além da abertura da reserva mineral na Amazônia de 47 mil km² para exploração pela iniciativa privada.

Os planos do governo para revitalizar a indústria minerária brasileira vai muito além da abertura da reserva mineral na Amazônia de 47 mil km² para exploração pela iniciativa privada.

Entre a estratégia está a abertura da faixa de fronteira, que corresponde a 27% do território brasileiro. São 2,5 milhões de km², o equivalente a 53 vezes o tamanho da área que entrou para o noticiário nos últimos dias, a Renca (Reserva Nacional de Cobre e seus Associados).

A região é rica em ouro, cobre, níquel, ferro, manganês e estanho, dentre outros elementos. E o governo conta com os frutos da exploração nessa área gigantesca como parte de um conjunto de propostas para aumentar a participação da produção mineral no produto interno bruto de 4% para 6%.

A sugestão inclui ainda abrir a área aos gringos. Um trecho de uma apresentação da secretaria, de abril deste ano, diz:

A SGM (Secretaria de Geologia, Mineração e Transformação Mineral, do Ministério de Minas e Energia) entende que a atual restrição ao capital estrangeiro é ultrapassada, devendo ser substituída por estímulos ao desenvolvimento sustentpavel da região fronteiriça e sua ocupaçaõ ordenada e sustentável de modo a garantir a segurança nacional.

Segundo este plano, a proposta do governo é dividida em três partes, uma medida provisória para criação da Agência Nacional de Mineração — que saiu do papel em julho; projetos de lei que alteram o Código de Mineração, abrem a faixa de fronteira, dão incentivo a investimentos na indústria mineral e tratam de compensação financeira pela mineração. E a terceira frente que são a publicação de dois decretos, um que regula o Código de Mineração e outro que extingue a Renca, publicado na semana passada.

Todo esse projeto está em circulação desde o início do ano. Em março, foi apresentado no Canadá, na Convenção Anual da Prospectors & Developers Association of Canada (PDAC). Em abril, na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). E em junho foi a vez de executivos de exploração mineral ouvirem a proposta.

Aos empresários, o diretor-presidente do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Eduardo Ledsham, deu mais detalhes sobre o que estaria em estudo para produção na área de fronteira. O foco da CPRM, segundo ele, é a região Amazônica, em áreas de fronteira do Amapá, Roraima, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul.

Nessa área, a CPRM mapeou 931 ocorrências de ouro, cobre, estanho, níquel e ferro. Ledsham, segundo nota da CPRM, “citou projeto Tunuí desenvolvido pela CPRM, na região da Cabeça do Cachorro (AM) na fronteira do Brasil com a Colômbia, que conta com o apoio do Exército Brasileiro e das comunidades indígenas locais”.

Alerta

Na avaliação do coordenador de Políticas Públicas do WWF-Brasil, Michel de Souza Santos, o interesse do País nessa área se deve à crise econômica. Ele destaca que atualmente tudo é proibido na região, mas há mineração ilegal no local.

“Existem pessoas que estão estudando flexibilizar isso porque a mineração estaria vindo tão forte, e o Brasil precisando tanto de investimento, por conta da crise, que haveria uma tentativa de alterar esses limites de áreas de fronteira permitindo atividades, inclusive mineração”, afirmou ao HuffPost Brasil.

Além de Souza, o jornalista Alexandre Versignassi, autor de Por que tudo custa caro no Brasil, também fez o alerta sobre o interesse em explorar a área. Em sua página no Facebook, ele pontuou que a Renca é só a “cereja do bolo”.

“A menina dos olhos das mineradoras, no entanto, é outra. Não se trata de uma área do tamanho da Dinamarca. Mas de uma do tamanho de quase toda a Europa Ocidental. É a “faixa de fronteira”. Trata-se de um espaço de 2,2 milhões de quilômetros quadrados (Portugal + Espanha + França + Alemanha + Reino Unido + Itália + Holanda + Suíça). Um espaço bem restrito à mineração, e proibido a empresas estrangeiras, por um decreto de 1979.”

A repercussão negativa da abertura da Renca para inciativa privada, no entanto, atrapalhou o plano de expansão que vinha sendo tratado no ministério. Na quarta-feira (30), o Valor Econômico já informava que essa proposta de expansão provavelmente seria engavetada. No dia seguinte, na quinta-feira (31), o Ministério de Minas e Energia voltou atrás na proposta de exploração da reserva na Amazônia pela iniciativa privada.

Em nota, o ministério anunciou a paralisação do processo para abertura de amplo debate pela sociedade. “A partir de agora o Ministério dará início a um amplo debate com a sociedade sobre as alternativas para a proteção da região. Inclusive propondo medidas de curto prazo que coíbam atividades ilegais em curso”, diz trecho da nota. Procurada pela reportagem, a pasta não se posicionou.

Por que a exploração preocupa

Ao HuffPost Brasil, Michel de Souza Santos, do WWF, ressalta que o choque que existe entre a produção de minério e os setores pela conversação ambiental se deve à falta de clareza sobre o que pode e o que não pode fazer em relação às áreas protegidas, tanto de terra indígena quanto de conservação.

Para ele, o Brasil precisa ser signatário de acordos internacionais. No caso da mineração, por exemplo, Santos alerta que o País corre o risco de ter uma empresa estrangeira que cumprem critérios rigorosos em seus países e que não precisam cumprir aqui, porque o Brasil não é signatário.

O setor é importante, representa 4% do PIB. A gente está aqui para que o desenvolvimento passe pela manutenção e proteção das áreas de conservação. E as atividades de mineração não podem se opor a essas áreas.

Ele reforça que não se trata de ser contra o setor. “O que queremos é suscitar que essas empresas tenham posicionamentos públicos do tipo: Não vou minerar em área protegida, não vou trabalhar para mudar leis que vão fragilizar áreas protegidas. A atividade minerária precisa ter a régua mais alta possível nas garantias de salvaguardas ambientais e direitos indígenas.”

Fonte: Huffpost