“É mais uma vez você jogar o peso da crise para cima dos trabalhadores e dos desempregados”, diz diretor do Dieese.
Especialistas na legislação trabalhista e na economia do trabalho estão criticando uma medida em estudo no Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, que, de acordo com informações do jornal O Globo, pretende reter parte do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) de trabalhadores demitidos sem justa causa, utilizando-o como parcelas do seguro-desemprego.
A ideia da medida é que, por três meses, o trabalhador desempregado receba um valor equivalente a seu último salário. O dinheiro, no entanto, seria retirado do saldo de seu próprio FGTS. Se, após esse período o cidadão não conseguir emprego, ele poderá dar entrada no pedido para receber o seguro-desemprego e a multa de 40%. Atualmente, os trabalhadores demitidos sem justa causa têm direito ao saque imediato e integral da conta do FGTS e da multa dos 40%, além do seguro-desemprego.
O projeto teria o objetivo de auxiliar o governo golpista de Michel Temer na economia do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), responsável pelo pagamento do seguro-desemprego a partir das contribuições do Programa Integração Social (PIS).
O governo afirma que o FAT é deficitário, uma vez que seus investimentos vêm crescendo anualmente. Foram R$14,07 bilhões gastos com o seguro-desemprego apenas entre janeiro e maio deste ano, de acordo com dados do MTE. Na prática, o benefício é recebido entre três e cinco parcelas, que variam entre R$937 e R$1.634, dependendo do tempo de serviço e do salário do trabalhador.
Para quem pesquisa a área, no entanto, a medida é descabida e faria com que o governo cumprisse um dever público a partir dos recursos privados do próprio demitido, economizando no pagamento do benefício aos desempregados para ajudar a fechar as contas públicas.
É o que afirma Flávio Batista, professor de direito do trabalho e seguridade social da Universidade de São Paulo (USP). “O FGTS é verba privada, então o governo não pode mexer nela. A função do Fundo é regulada por lei. Por isso, a medida mexe na regularização do saque para fazer uma arrumação com os números”, disse.
Ele explica que a Constituição Federal é muito genérica em relação ao Fundo, e pode ser alterada facilmente. “Eu posso até sustentar razões que apontariam para a inconstitucionalidade dessa medida, mas com o poder judiciário que a gente tem, a chance de isso ter repercussão é pequena”, opinou.
Direitos
Para Fausto Augusto Junior, Coordenador de Educação e Comunicação do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a medida prejudicaria os trabalhadores. “A proposta não faz sentido nenhum, é mais uma vez você jogar o peso da crise para cima dos trabalhadores. Sempre que tem alguma crise fiscal você vai tirar o dinheiro do desempregado, o que é a coisa mais cruel que existe”, opinou.
Ele destaca que a medida faz parte de um conjunto de flexibilização das leis trabalhistas. “No momento em que você tem uma política clara de desconstrução de direitos, essa medida vem junto. É claramente um projeto de retirada de direitos dos trabalhadores. O seguro desemprego cumpre um papel importante para as pessoas reorganizarem a vida. Em uma recessão, com mais de 14 milhões de desempregados, qualquer proposta de mexer nele é absurda”, ponderou.
O Coordenador do Dieese diz que a medida prejudicaria a economia real do país, uma vez que, sem o dinheiro do seguro desemprego, as pessoas consomem menos. “A economia vai estar cada vez mais parada e uma crise gera a outra. Há uma série de equívocos na proposta”.
Em nota, o Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão afirmou que é importante ressaltar que “qualquer medida deste governo não retira direitos do trabalhador”.
Proposta desconhecida
O jornal O Globo pautou o projeto na última sexta-feira (23), destacando que a ideia já chegou a ser apresentada há duas semanas pelo ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, a representantes do setor da construção civil. O jornal apontou também que a ideia está sendo discutida com técnicos do Ministério do Trabalho, órgão responsável pela regulação do FGTS. O Ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, chegou a admitir, em entrevista à imprensa no dia 23, que existem estudos no governo para o uso do FGTS como seguro-desemprego.
Em nota, o Ministério do Planejamento afirmou que o estudo é um projeto “ainda bastante embrionário”, e que o Ministério não irá se manifestar sobre o assunto, já que ele “sequer foi levado ao conhecimento do ministro do Planejamento”. Já o MTE destacou que não tem nenhuma informação sobre o assunto.
Fonte: Brasil de Fato