Análise de risco. A renda formal, que indica capacidade de pagamento futuro, é componente de peso no processo de avaliação do banco, especialmente no atual cenário, de maior seletividade.
Se, diante da maior seletividade dos bancos, o trabalhador brasileiro está encontrando dificuldades para conseguir empréstimos e financiamentos, sem comprovação de renda formal a missão fica ainda mais complicada.
Segundo a última pesquisa de emprego e rendimento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), referentes ao trimestre encerrado em outubro de 2015, o número de trabalhadores com carteira assinada no País caiu 3,2% em relação ao mesmo período de 2014. A variação representa redução de 1,18 milhão de assalariados.
Embora não seja o único componente dos modelos de análise de riscos, a renda formal tem um peso importante na avaliação das instituições financeiras, apontam especialistas ouvidos pela reportagem.
“O banco tem que saber se o cliente tem capacidade de pagamento futuro. A instituição vai buscar estimar se ele tem renda suficiente para pagar as necessidades básicas mais as prestações”, explicou Nicola Tingas, economista da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi).
Dados do Banco Central mostram que as concessões de crédito, que representam as novas operações aprovadas pelas instituições financeiras, estão em desaceleração e, desde abril do ano passado, registram quedas reais. Em novembro, último dado disponível no BC, a retração foi de 8,53% em 12 meses.
De acordo com Marcelo Cambria, professor de Finanças da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), os bancos estão sem apetite para risco e, qualquer sinal de dificuldade de pagamento por parte do cliente, já dificulta a liberação do crédito.
“A informalidade deixa quase nula a capacidade de o trabalhador tomar crédito e, praticamente, os conduz para as financeiras, que têm juros maiores”, disse.
Outros itens como tempo de relacionamento com o banco (que inclui movimentação da conta corrente e investimentos), histórico de bom pagador e “nome limpo” nos birôs de crédito também contam na avaliação, lembram os especialistas.
Com o avanço da inflação e do desemprego, no entanto, esses componentes – e até mesmo o próprio registro em carteira – perdem peso e deixam o processo de aprovação do crédito mais complicado. “A inflação alta faz com que a pessoa possa ter dificuldades com o pagamento”, expõe Tingas, da Acrefi.
Mitigação de risco
Quando um trabalhador recebeu salário formal durante todo seu relacionamento com o banco e, de repente, deixa ganhá-lo, a instituição financeira nota que o cliente ficou desempregado, observa Marcelo Monteiro, especialista no mercado de recuperação de crédito e diretor de novos negócios da PH3A.
“Se a pessoa vivia somente do salário e passa para a informalidade, significa que ela vai começar a fazer ‘bicos’. Isso trará mais dificuldade em uma aprovação de crédito, mesmo com bom histórico de movimentação bancária”, avaliou.
Segundo Cambria, o risco de uma renda não recorrente (bicos) é quase tão alto quanto a ausência de renda. “Para conseguir o crédito, nesses casos, é preciso declarar que tem imposto a receber e quer antecipar a restituição junto ao banco, por exemplo”, disse.
Muitas das pessoas que trabalhavam com carteira assinada e foram demitidos usaram o dinheiro da rescisão para abrir sua própria empresa, conforme mostrou o DCI, em matéria publicada em novembro de 2015.
Mesmo para esses profissionais, contudo, a aprovação pode ser difícil. Monteiro lembra que taxa de mortalidade das empresas novas é alta – pesquisa do IBGE divulgada no final do ano passado, com dados de 2013, mostra que 52,3% das empresas fecham as portas após quatro anos de atividade.
“Ao analisar a empresa, o banco vê o quanto os recursos são perenes e o quanto são esporádicos. Atualmente, as instituições não estão aprovando crédito sem muita comprovação de fluxo de caixa”, disse.
Poupança
Diante do cenário econômico atual e as expectativas para 2016, Monteiro indica que o caminho para o consumidor é guardar dinheiro para comprar o bem à vista ou dar uma entrada mais significativa no crédito.
“A pesquisa do IBGE é de outubro. De lá pra cá, o número de trabalhadores sem carteira assinada já deve ter aumentado e não há perspectiva de melhora”, avaliou o especialista.
De acordo com Cambria, os spreads, que representam os ganhos do banco com os empréstimos, são compostos pelo custo de captação (ou seja, quanto a instituição gasta para levantar recursos), os riscos de inadimplência do cliente e o lucro. “Todos eles estão aumentando”, apontou, lembrando que a taxa básica de juros (Selic), usada como base para as demais taxas, está em 14,25%, com perspectiva de nova elevação.
Fonte: fsindical.org.br