Curso de lay-off frustra trabalhador

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Cursos que não atendem necessidades de qualificação dos profissionais, agregam pouco para sua formação e chegam a ser vistos como um castigo.

É dessa forma que muitos trabalhadores de montadoras da região que passam por lay-off (suspensão temporária do contrato de trabalho) relatam as aulas que são obrigados a fazer, como contrapartida para ficar em casa por até cinco meses (renováveis por mais cinco) e receberem pagamento.

Não se pode negar que os programas oferecidos atualmente pela Mercedes-Benz e pela General Motors (ambas que têm empregados em lay-off atualmente), têm a ver com o setor metalúrgico. Aulas ministradas pelo Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) como as de auxiliar de produção, mecânica de manutenção e até RH (Recursos Humanos), por exemplo, podem ser consideradas (em alguma medida) relacionadas a essa área.

Os trabalhadores, no entanto, se queixam de que as empresas não os ouve para saber que cursos eles teriam interesse de fazer, dentro de sua área de trabalho. “Não focam na necessidade do profissional”, diz um dos empregados suspensos pela Mercedes-Benz em São Bernardo, sem se identificar. “Todo curso é válido para adquirir conhecimento, mas deixa muito a desejar”, afirma outro, da General Motors de São Caetano. E, para piorar, há quem relate até que está cursando pela segunda vez aulas que já foi obrigado a fazer durante esse afastamento. “Estou repetindo o de auxiliar de produção, que já fiz no ano passado”, conta metalúrgico que está há quase dez meses afastado pela Mercedes. Outro operário, da mesma empresa, conta que durante o primeiro afastamento cursou de auxiliar de produção e, agora, o de RH. “Não tem nada a ver com a minha área, não serve para quase nada”, desabafa. “Mesmo o de auxiliar de produção era muito básico, não nos oferecia informações novas, que ainda não soubéssemos.” Em todos os casos ouvidos, os trabalhadores contam que não tiveram a chance de escolher o que cursar.

Em relação à crítica de que trabalhadores da empresa passam por aulas repetidas, a Mercedes-Benz nega que adote essa prática e que oferece oportunidade para eles se reciclarem. “O que podem ocorrer são disciplinas comuns, dependendo da escolha do interessado, que pode optar por dois cursos ao mesmo tempo”, afirma a companhia, por meio de nota. E acrescenta que o intuito é manter o colaborador atualizado sobre temas da indústria automobilística, oferecendo treinamento com base técnica em metrologia, desenho, matemática, logística, programação de produção, manutenção, soldagem e operação em CNC, por exemplo. A General Motors foi procurada, mas não comentou sobre a qualidade ou o formato dos cursos.

Contatado pela equipe do Diário, o Senai informou que a escolha da grade curricular, da carga horária, da duração dos programas e de como serão agrupados os trabalhadores em lay-off que vão receber as aulas fica a critério da montadora, sem ingerência da instituição de ensino.

REGRAS – A legislação do lay-off é recente. Resolução do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego), publicada em 2009, estabeleceu as regras para o pagamento de bolsa de qualificação profissional prevista para os suspensos, que foi instituída por medida provisória de 2001. Esse dinheiro, conforme o acordo coletivo, pode corresponder ao salário líquido, em que a empresa paga ajuda compensatória, sem natureza salarial e, por isso, fica livre de encargos sociais, enquanto o MTE, no prazo inicial de até cinco meses, complementa com recurso equivalente ao teto do seguro-desemprego, de R$ 1.385,91, com verba do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador). Se houver prorrogação da suspensão, o montante é pago integralmente pelo empregador.

Outra exigência desse acordo é que o trabalhador suspenso recebe a bolsa desde que comprove, pelo menos, 75% de frequência às aulas, as quais, de acordo com a norma, têm de assegurar qualidade pedagógica e estarem relacionadas às atividades da empresa – 85% das ações formativas deverão ser cursos ou laboratórios e, o restante, 15%, seminários ou oficinas. Há relatos de pessoas que deixaram de receber o valor mensal pelo fato de terem excedido as faltas.

INADEQUADO – Representantes do setor industrial da região veem com preocupação as críticas sobre a qualificação no período de suspensão. “Essas pessoas têm famílias, têm despesas, não têm tempo a perder, precisam procurar se aprimorar”, afirma o diretor titular do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) de Diadema, Donizete Duarte da Silva.

Para o dirigente, é natural que trabalhadores que já têm longos anos de casa em montadora fiquem frustrados ao terem de fazer cursos como o de auxiliar de produção, pois já receberam, ao atuarem nessas grandes empresas, formação, inclusive, de sistemas de gestão. “Quando se fala de uma pequena empresa isso não é necessariamente verdade, mas oferecer aulas introdutórias para quem já tem de cinco a dez anos nesse meio em montadora, ele vai ficar decepcionado, é uma capacitação inadequada”, diz.

A Mercedes-Benz tem 715 profissionais afastados até o dia 27 e, na sexta-feira, anunciou a demissão de 500 deles, com a possibilidade de adesão ao PDV (Programa de Demissão Voluntária). Hoje, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC faz assembleia com os trabalhadores para definir encaminhamento de greve contra os cortes. A GM prorrogou por mais três meses o lay-off de 819 funcionários que deveriam retornar ao trabalho no dia 10.

// Fonte: Força Sindical