A Copa do Mundo deu, pelo menos até o primeiro quadrimestre, uma ajuda modesta ao emprego formal.
Nas cidades-sede do evento esportivo e nos setores diretamente beneficiados – alojamento, alimentação e agências de turismo – foram criados apenas 3 mil empregos no mercado formal de janeiro a abril. Embora seja o dobro do número de vagas registradas no mesmo período do ano passado, o número é considerado baixo.
A principal contribuição da Copa do Mundo ao emprego será temporária. Nos meses de junho e julho estão sendo abertas vagas extras em hotéis, bares e restaurantes e agências de turismo para atender turistas brasileiros e estrangeiros e também ao aumento do fluxo dos próprios moradores das cidades-sede, que tendem a frequentar mais bares nos horários de jogos e depois, para eventuais comemorações.
A expectativa da Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação (FBHA) é que os jogos criem 36,9 mil postos temporários em junho e julho – 7 mil no ramo de hospedagem e o restante no de alimentação. Alexandre Sampaio, presidente da entidade, estima que entre 3% e 5% dos postos devam se tornar efetivos. “O número pode ser maior, mas isso vai depender da imagem que o Brasil passar para o mundo”, afirma. Se os espectadores estrangeiros do torneio, tanto os que estão fora do país quanto os que vieram até aqui, virarem multiplicadores do turismo a ponto de mudar o patamar de 6 milhões de visitantes que o país recebe anualmente, os segmentos de alojamento e alimentação, por exemplo, vão eventualmente ter de aumentar o estoque de trabalhadores. A África do Sul foi bem-sucedida nesse aspecto, afirma.
As cidades do Nordeste e Manaus estariam entre as mais beneficiadas, afirma, já que têm uma infraestrutura turística mais modesta do que a do Rio de Janeiro, por exemplo. A capital fluminense está entre as cidades-sede que mais vêm contratando desde o ano passado, devido especialmente ao crescimento da oferta de quartos no período, avalia Sampaio. Nos últimos dias, o ramo de bares, restaurantes e catering da capital tem elevado também as contratações de curtíssimo prazo, de dois ou três dias, para dar conta do aumento da demanda. As estatísticas não aparecem nos indicadores de ocupação, já que não são regulamentadas, mas mostrarão sua influência positiva na renda.
São Paulo deve devolver boa parte das 12 mil vagas temporárias estimadas para abrir em junho e julho, afirma Sampaio, por conta da desaceleração do turismo de negócios neste ano – não por conta do campeonato, defende, mas pelas eleições de outubro. “Muitas empresas postergaram encontros e treinamentos, porque decidiram contingenciar gastos até o resultado.”
Donos de bares e restaurantes no centro da capital paulista estão adorando a Copa, pois é lá que a Fifa montou o Fan Fest na cidade. No dia da estreia da seleção brasileira mais de 30 mil pessoas foram assistir ao jogo, no telão, e aos shows populares no Vale do Anhangabaú.
Um pouco antes da partida, dezenas de torcedores croatas e mais de 200 australianos, com suas camisas amarelas que lembram as do escrete canarinho, “invadiram” o Salve Jorge, na Praça Antonio Prado, a 200 metros do palco do Fan Fest. O dono do bar, Felício Salomão, estava num misto de perplexidade e entusiasmo, sem parar um minuto de orientar os garçons.
Ele prevê “forte” aumento da demanda ao longo de todo o mês de Copa, mas mesmo assim não mexeu no quadro de pessoal. Salomão decidiu transformar os turnos da manhã e da tarde em apenas um e pagar horas extras aos funcionários. “Todo mundo, da cozinha e do salão, agora trabalha do meio-dia às 23h, meia-noite.”
Para garantir que o serviço acompanhe o aumento de clientes ele optou por ter sempre um time de cinco garçons freelancers, que recebem uma diária de R$ 140. “Até agora não foi preciso fazer contratações extras, mas tenho uma agenda de colaboradores, é comum no nosso ramo”, conta Salomão.
A estratégia dos concorrentes na região central é a mesma. Antonio Augusto Costa Silva, dono do tradicional bar e restaurante Guanabara, desde 1910 no Vale do Anhangabaú, também optou por contratar mais três ou quatro garçons nos dias de jogo da seleção pagando diárias de R$ 60. Além disso, os diaristas dividem com o resto da “brigada” do estabelecimento o total dos 10% de serviços do faturamento do dia.
“Para falar a verdade, estava com medo de abrir na Copa, por causa dessas manifestações e greves. Estou na boca do gol, não quero problemas”, diz o simpático Toninho, apontando a multidão que torce pelo Brasil a poucos passos de seu estabelecimento na festa organizada pela Fifa. “Meu espaço é grande, mas o pessoal quer ficar do lado de fora, vendo o jogo e fazendo festa, então a gente dá conta com a brigada que temos. Só nos dias de pico pegamos os freelancers.”
Os dois empresários convocaram as mulheres e os filhos para trabalhar durante a Copa. Mas é para ajudar no contato com os turistas. Cláudia Saez, casada com o dono do Salve Jorge, é professora de inglês e tradutora. “Eu arranho um pouquinho no inglês, mas é ela que dá conta dos gringos, mas vou pagar salário direitinho para ela”, brinca Salomão.
Já Toninho levou o ‘furo’ da mulher e do filho no dia do jogo de estreia do Brasil e foi ajudado por um amigo português, que fala bem inglês, para fazer a frente com os estrangeiros. Ele acha que os garçons não estão interessados em aprender inglês só para trabalhar durante a Copa. “Não adianta dar curso. Na hora que o movimento pega, a comunicação é por gestos, e a palavra mais importante eles já aprenderam: beer”, diz Toninho, confessando que também não sabe nada de inglês.
Para Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), o aumento de vagas nas cidades-sede da Copa em ritmo superior ao das demais capitais neste início de ano sugere que o evento esportivo ajudou o emprego, mas lembra que as informações sobre o fluxo de estrangeiros, principalmente, indicam que o setor de turismo (hotéis inclusive) se decepcionou, o que pode explicar o crescimento fraco do emprego formal no setor nos meses pré-evento.
O pesquisador espera um movimento mais forte de contratações temporárias em junho e julho. “Um hotel normalmente precisa contratar antes e treinar, mas um garçom é uma mão de obra temporária de reforço e você precisa dela para os dias do evento”, afirma. Esse foi o espírito dos bares e restaurantes de São Paulo, explica o presidente da associação do setor, Percival Maricato. “O reforço é temporário, e só uma pequena parte acaba sendo incorporada. E isso pode acontecer especialmente em áreas “novas”, como o Pantanal, se a Copa funcionar mesmo como um impulso para o turismo internacional”, pondera ele.
Erle Mesquita, coordenador de estudos e análises do Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (IDT), de Fortaleza, lembra que o começo e o meio do ano são períodos de alta sazonal do emprego no Nordeste, mas avalia que o evento deve dar uma das principais contribuições para o saldo de vagas do país neste ano, especialmente no setor de serviços. “Se não fossem os jogos, a deterioração que temos visto no mercado de trabalho seria bem pior”, completa. Fora dos números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o emprego informal também deve aumentar nesses dois meses, graças ao movimento do comércio ambulante próximo dos estádios e dos Fan Fest da Fifa.
A coordenadora da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Lúcia Garcia, faz análise semelhante e conta que em Porto Alegre, onde mora, o comércio de rua cresceu de maneira significativa nos últimos dias. “Parece que as pessoas agora se sentem autorizadas a ficar felizes por seu país.”
No campo formal, os hotéis da capital gaúcha também estão ampliando as contratações. “Só vamos conhecer os números concretos a partir de agosto”, afirma. O hotel de 84 quartos recentemente inaugurado ao lado da sede do Dieese em Porto Alegre, porém, está completamente cheio para as duas semanas das oitavas de final, diz Lúcia.
//Fonte: Força Sindical